Linguística

O que é linguagem neutra

 
Isadora R. Hausen
Por Isadora R. Hausen. 27 setembro 2023
O que é linguagem neutra

Nunca se falou tanto em inclusão como na atualidade. A busca por uma sociedade mais inclusiva e aberta às diferentes identidades de gênero é um dos temas mais discutidos entre antropólogos, sociólogos e linguistas. O preconceito, em todas as suas formas, nunca foi tão combatido.

Nesse sentido, a inclusão permeia vários aspectos da vida em sociedade e, sendo a maneira de expressar dos indivíduos, nada mais natural que as discussões sobre representantividade e inclusividade entrarem também no âmbito da linguística e da linguagem.

Assim, desenvolveu-se a tão comentada linguagem neutra. No entanto, mal ela foi criada e já está envolta em algumas controvérsias, incluindo questionamentos sobre a sua aplicabilidade e validade. Mas, afinal, o que é linguagem neutra? Neste artigo do umCOMO explicaremos o significado deste que virou um dos assuntos mais debatidos do momento.

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Índice

  1. Linguagem neutra: o que é
  2. Exemplo de linguagem neutra
  3. Linguagem neutra nas escolas
  4. O que os especialistas dizem sobre a linguagem neutra

Linguagem neutra: o que é

Em tempos em que a identidade de gênero, a representatividade e a inclusão são temas bastante debatidos mundialmente, nos ambientes acadêmicos, profissionais e familiares, surge uma nova forma de buscar incluir todos os gêneros naquela que é um importante instrumento de expressão cultural: a linguagem.

Os defensores e ativistas da inclusão social afirmam que a língua portuguesa, como até então se aprende e se fala, não representa todos os gêneros existentes na sociedade. Afinal a língua é binária (se diferencia entre masculino e feminino) e, segundo eles, sexista, uma vez que ao se referir a um coletivo de indivíduos, usa-se a forma “todos”, no masculino.

Dessa forma, com a crescente conscientização sobre diversidade e inclusão, desenvolveu-se a linguagem neutra como forma de "evitar a exclusão de pessoas com base em sua identidade de gênero, sexualidade, ou outros aspectos de identidade”[1].

O que é não binário

A linguagem neutra é também entendida como não-binária. Já o termo não-binário é usado para designar aquelas pessoas que não se enquadram na classificação binária de gênero, ou seja, aqueles que não se indentificam inteiramente como homens nem como mulheres. Assim, a neutralidade da língua representa uma "tentativa de contemplar todos os gêneros e validá-los no discurso”[2].

Exemplo de linguagem neutra

Nessa nova linguagem, os artigos tradicionais de diferenciação de gênero "o" (masculino) e "a" (feminino) são substituídos por um "x", "e" ou "@". Como exemplo, as palavras usadas para expressar o coletivos de homens e mulheres, "todos" ou “todas", respectivamente, passam a ser expressados por "todes", "todxs" ou “tod@s".

Contudo, há quem defenda que não é aconselhável o uso de “x” nem de “@“ na linguagem neutra ou inclusiva, pois estas grafias estariam restritas apenas à expressão escrita da língua e que a forma oral ficaria impronunciável.

Seguindo o mesmo conceito, a linguagem neutra também altera a utilização dos pronomes de gênero binário “ele” e “ela”, “dele” e “dela”, por “elu” e “delu”, não fazendo, assim, referência a nenhum gênero específico.

Ainda, os substantivos e as formas de tratamento também foram adaptadas de forma a não fazerem diferenciação baseadas na classificação binária de gênero. Palavras como “homem" e “mulher" passam a ser substituídas por “pessoa" ou “indivíduo” e termos como “prezadas" e “prezados" são expressos como “prezades”.

Linguagem neutra nas escolas

Apesar da linguagem neutra ser bastante discutida e ela já ser utilizada por muitos círculos e meios sociais, o ensino da linguagem neutra nas escolas ainda é uma questão bastante controversa e tema de grandes debates nos meios acadêmicos e jurídicos.

Recentemente, alguns estados brasileiros sancionaram leis que proíbem a linguagem neutra nas escolas e em concursos públicos[3]. A mais notória delas talvez seja a lei 5.123/21, de Rondônia, suspensa pelo ministro do Supremo Tribunal Federal, Edson Fachin, que explicou a sua decisão alegando que a linguagem neutra visa combater preconceitos linguísticos. Contudo, o julgamento desse caso encontra-se paralisado devido a um pedido de destaque do ministro Nunes Marques e ainda não há data marcada para a retomada da análise.

A lei 5.820/21, do Mato Grosso do Sul, torna obrigatória a utilização da norma culta da Língua Portuguesa em instrumentos de aprendizagem veiculados nas escolas, nos materiais didáticos e nos documentos oficiais. Já a lei 9.077/21, do município de Joinville, Santa Catarina, veda expressamente a utilização de linguagem "estranha à Língua Portuguesa" para flexão de gênero em documentos e demais instrumentos da administração pública municipal.

No âmbito nacional, na Câmara dos Deputados tramita o PL 5.248/20 que "proíbe o uso da linguagem neutra na grade curricular e no material didático de instituições de ensino públicas ou privadas no ensino da Língua Portuguesa no ensino básico e superior[4]. A proposta defende que o aprendizado seja baseado nos seguintes preceitos já estabelecidos: Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs); Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (VOLP); e Acordo Ortográfico de Língua Portuguesa.

Para além do âmbito curricular de ensino, o texto do projeto de lei veda o uso da linguagem neutra em documentos oficiais dos entes federados, em editais de concursos públicos, assim como em ações culturais, esportivas, sociais ou publicitárias que recebam verba pública de qualquer natureza.

O que os especialistas dizem sobre a linguagem neutra

Como não poderia deixar de ser, a questão do emprego da linguagem neutra é tema de debate também entre os especialistas em linguística. Muitos são os que questionam a necessidade e a motivação da neutralidade, além do fato de ser uma forma de expressão correta ou não.

Para a professora do Departamento de Letras Vernáculas na Universidade Federal de Sergipe, Raquel Freitag, a linguagem neutra é "uma coisa que não existe. Não existe neutralidade, em nada no mundo. Eu advogo por uma a linguagem inclusiva de gênero, que está na pauta dos movimentos feministas há muito tempo”[5].

Sobre a aplicação da linguagem neutra nas escolas, o especialista, André Valente, argumenta que "nunca se falou em acabar com o masculino e o feminino, nem em neutralizar tudo. O que se propõe é ensinar que a língua é uma forma de refletir a sociedade em que vivemos e que é variável. Que as palavras não são neutras, elas fazem parte das relações sociais. Que, se no passado, masculino e feminino bastavam, hoje, não bastam mais”[6].

Já a especialista em língua portuguesa pela Universidade Federal de Minas Gerais, Cíntia Chagas, defende que o pronome “todos” já abriga o gênero neutro. “Conforme eu venho falando, trata-se de uma questão ideológica. A língua portuguesa vem do latim. Na passagem do latim para o português, o que era neutro se tornou masculino. Falar boa noite a todos e a todas é uma redundância,” afirmou a professora em uma entrevista ao Programa Pânico, do canal Jovem Pan.

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Referências
  1. LINGUAGEM NEUTRA E ACESSIBILIDADE. Disponível em: <https://www.handtalk.me/br/blog/linguagem-neutra-e-acessibilidade/>. Acesso em 25/09/2023.
  2. MANUAL DE LINGUAGEM NEUTRA. Disponível em: <https://portal.unila.edu.br/informes/manual-de-linguagem-neutra/Manualdelinguagemneutraport.pdf/>. Acesso em 25/09/2023.
  3. LINGUAGEM NEUTRA: VEJA O QUE É E CONHEÇA AS LEIS CONTRA A SUA UTILIZAÇÃO. Disponível em: <https://www.migalhas.com.br/quentes/357892/linguagem-neutra-veja-o-que-e-e-conheca-as-leis-contra-sua-utilizacao/>. Acesso em 25/09/2023.
  4. LINGUAGEM NEUTRA: VEJA O QUE É E CONHEÇA AS LEIS CONTRA A SUA UTILIZAÇÃO. Disponível em: <https://www.jusbrasil.com.br/noticias/linguagem-neutra-veja-o-que-e-e-conheca-as-leis-contra-sua-utilizacao/1352712064/>. Acesso em 25/09/2023.
  5. LINGUAGEM NEUTRA. Disponível em: <https://blogfca.pucminas.br/colab/linguagem-neutra/>. Acesso em 25/09/2023.
  6. TODES: ESPECIALISTA FALA SOBRE A INCORPORAÇÃO DA LINGUAGEM NEUTRA NAS ESCOLAS. Disponível em: <https://observatoriog.bol.uol.com.br/noticias/politica/todes-especialista-fala-sobre-a-incorporacao-da-linguagem-neutra-nas-escolas/>. Acesso em 25/09/2023.
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